sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Não é como nos filmes

Na vida dela quase nunca houve nada assim. Não houve abraços, não houve confissões, não se revelaram emoções, nunca se pediu desculpa. Nunca ninguém disse “amo-te”. Mas havia gritos, intolerância, pouca fé, silêncios e muitas esperas que o tempo apagasse erros. Constragia-a até assistir a uma cena de emoções num filme, com a família na mesma sala. Porque ninguém era capaz disso. Cultivou-se sempre uma distância física e emocional, que ela carrega até hoje. Só descobriu que não precisava de ser assim quando começou a frequentar a casa de amigos, que abraçavam os pais, que não só riam juntos mas choravam juntos. Amigos que não tinham receio de a abraçar, de pedir desculpa, de mostrar que a amavam. E só aí percebeu que não era preciso ser o que sempre conheceu, que as coisas podiam ser mais abertas e fáceis. Que a emoção não lhe estava vedada, e não era um sinal de fraqueza. Que era afinal sim um prazer, gerador da melhor felicidade.
Continuam sempre a surgir na nossa vida pessoas assim, que evitam qualquer contacto com o que sentem. Que nunca dizem “amo-te”, que nunca pedem desculpa, que não se permitem gozar a fundo a felicidade. Provavelmente não tanto porque querem que assim seja, mas porque aprenderam que é assim. E fica uma espécie de colete de forças no coração, que nunca o deixará expandir.
Interrogo-me sempre porque é que não facilitamos a vida a nós próprios. Porque é que contemos sempre o que sentimos de melhor em nós, mas soltamos o pior com a maior felicidade. Mas não tenho resposta para isso.