quinta-feira, 13 de maio de 2004

Macarrão ou Mini-saia?


Mais uma manhã. O pobre despertador fez o seu monumental esforço para acordá-la – tocou umas dez vezes. Mais uma vez foi derrotado pela gata e os seus incrivelmente projectados miados do cio. Depois de algumas tentativas falhadas para a mandar calar, rendeu-se à evidência de ter que se levantar e, de olhos meio fechados, sentou-se na cama, enfiou os pés nas pantufas, agarrou no comando da televisão e quando se pôs de pé, já tinha a voz da pivot da manhã a atirar-lhe com as notícias do trânsito. Como se as filas intermináveis e os acidentes ainda pudessem ser notícia.
A caminho do quarto-de-banho, viu passar no espelho um vulto desconhecido, grande e largo, que parecia arrastar-se sem energia. Ainda com o comando na mão, e sem se voltar para a televisão, mudou de canal, antes de o deixar em cima da cómoda. Enquanto lavava os dentes, ouviu a história de mais uma mulher feliz, que perdeu 10 quilos em dois meses. Tanta promessa de uma vida diferente, de ser atraente, de poder vestir todos os tipos de roupa, de tudo lhe assentar bem... Ainda assim, espreitou, de escova na boca, para ver as fantásticas fotos do antes/depois. Uau... Será verdade...? Parece verdade...
Veio ao quarto deixar o pijama e mais uma vez deixou-se parar uns momentos só para ver os senhores musculados e as senhoras bem torneadas a correrem nos aparelhómetros de impacto físico 0%, resultado físico 100%. Uff, parece cansativo... mas... também parece funcionar... E depois de mais uma fotografia antes/depois, voltou a mudar de canal e foi para o banho lavar a inveja.
Debaixo da água quente, olhou para baixo e... Céus, desde quando tenho que me inclinar para a frente para ver bem os... pés? De onde me veio esta barriga de pintura barroca que não estava aqui há dois anos? Não. Não. Ela até era fã da pintura barroca. E as mamas, quem deixara entrar ar lá para dentro? Argh...
Do banho para o guarda-vestidos. Guarda roupa reduzido a algumas peças, com a maior parte pendurada nos cabides do fundo, à espera de voltar a caber nela. Suspirou. Ora bem, o que é que me cobre o rabo, o que é que não me aperta as mamas, o que é que ainda me marca a cintura... Pelo espelho vê a terceira fotografia antes/depois. E a quarta, a quinta... Uau... Desta vez não há promessas, há um desafio. “Você consegue? Mudar os seus hábitos, fazer exercício, durante 12 semanas? Inscreva-se! Vá a www.getwiththeprogram.org e aceite o desafio! Assine um contrato consigo mesmo!”.
Contemplou-se. As sombrazinhas de celulite nas pernas. Desde quando havia tanto dela no mundo? Desde quando tinha passado a ser duas?? Virou-se. Céus, como foi isso tudo parar aí atrás?? No écran da televisão, as recém magras. E nesse momento decidiu! Vou começar a fazer caminhadas, não vou comer fritos, não vou comer doces nem enchidos, nem pizzas nem McDonalds, vou beber muita água, em suma: Dieta e Exercício! Vestiu-se, tomou um pequeno-almoço saudável e sem calorias, e quando saiu de casa naquele dia, até já se sentia um pouco mais elegante, só por ter tomado a decisão. E andou assim, de espírito determinado e garrafa de água por perto, até à hora de almoço. Então chegou o almoço. E os vários restaurantes por onde escolher. E as inúmeras tentações. Tagliatelles com queijo, bacalhau com natas, crepes chineses fritos, alheira e batata frita, enchiladas mexicanas... o apetite a aguçar, os colegas esfomeados a querer comer, e ela? Depois de uma longa manhã de árduo trabalho, ia consolar-se com o quê? Uma posta de peixe grelhado com salada, acompanhada de água, e uma maçã para sobremesa? E ia ser assim durante quanto tempo? Para sempre? A determinação começou a vergar. Já sentia as ancas a aumentar, as mamas a insuflar, a barriga a descair...! Viu os botões da camisa começarem a saltar, as costuras das calças a rebentar...! E foi então que ela teve que tomar a verdadeira decisão. O que é lhe dava de facto mais prazer: vestir roupas bonitas... ou comer?