terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Coisas que nunca me ensinaram na Escola de Condução

1. Os piscas são acessórios opcionais; 90% do carros em circulação não está munido deste material.
2. BUS significa: faixa exclusiva, destinada aos intelectualmente abençoados, que fazem transportar-se em monovolumes, também conhecidos por “chico-espertos”.
3. Todos os outros condutores são mais burros e incompetentes do que eu.
4. Todos os outros condutores são meus inimigos mortais.
5. A minha vida é muito mais importante para o mundo que a de qualquer outro condutor.
6. As pedras da calçada identificam os pontos de estacionamento, bem como largas faixas brancas de um lado ao outro da estrada, ou postes com números e coberturas da chuva.
7. A minha capacidade de ultrapassar os outros é prova factual da minha superioridade mental e física sobre os outros. Sem estas vitórias diárias, sou um fracasso.
8. As zebras, tal como qualquer outro animal, não sabem o seu lugar e podem ser atropeladas.
9. Aqueles condutores com a letra L no tejadilho são um empatanço, e já deviam ter nascido ensinados, como foi o meu caso.
10. O tamanho e a potência do meu veículo é proporcional ao amor e admiração que os outros sentem por mim.
11. Os peões são um estorvo a erradicar, para que haja mais espaço para o meu veículo.
12. Todas as regras do trânsito foram criadas exclusivamente para obediência dos outros condutores. Eu sou impune. E parece que há polícias que têm a petulância de ainda não ter percebido isso.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Os beijoqueiros

Gosto destas pessoas. Não haverá assim tantas, e normalmente, claro, são mulheres. Dão beijos como uma facilidade incrível, à família e aos colegas de trabalho. Como a Elisa. Não é melosa, nem pirosa, nem fingida, nem chata. Mas dá beijos, sem o menor constrangimento. Não será por dá cá aquela palha, mas dá. Admiro este à vontade. Acho uma maravilha, porque a mim não me passaria pela cabeça achar que as pessoas em geral não se importariam de receber beijos meus, sem serem os do cumprimento da praxe.
A Elisa dá-os na cabeça, no rosto, mas daqueles sentidos. Fez-me lembrar um rapaz que conheci já devem ir uns 17 ou 18 anos. Já nem me lembro do nome dele. Mas dizia ele que achava os beijos no rosto, no cumprimento às mulheres, muito fugazes e sem sentimento. E não, não era depravado. Segurava-nos o rosto e beijava-nos a testa. Por altamente fútil e piroso que este texto possa soar, o facto é que percebi naquela altura como estamos todos tão pouco habituados a beijos sentidos. E o beijo na testa tem algo de carinhoso e respeitoso, e transforma os dois beijos passageiros e insignificantes numa manifestação de sentimento.
É por isso que gosto dos amigos / colegas / conhecidos beijoqueiros. Aqueles cujos beijos realmente nos atingem a pele e até fazem som. Que mostram que as manifestações de carinho fora do seio familiar podem ser a coisa mais normal do mundo. A minha conclusão é que todos devíamos praticá-las e quebrar aquela barreira física que muitos de nós parecem ter. O nosso espaço individual é para a maioria demasiado restricto e inflexível. E raios, porque é que havemos de ter vergonha de beijar um amigo?

domingo, 20 de janeiro de 2008

Felicidade em variedade



Numa espécie como a nossa, com a nossa capacidade mental, seria de esperar que facilitássemos a vida a nós próprios. Bom, talvez o façamos em certo aspecto. Somos cada vez mais permissivos a nível ético, observamos passivos todas as infracções, a má-formação alheia e a nossa própria.
Contudo, somos cada vez mais exigentes a nível estético. E é uma exigência estúpida. Inventou-se um padrão, e agora temos que ser todos iguais. Os mesmos narizes, as mesmas bocas, os mesmos rabos, as mesmas mamas, as mesmas alturas, as mesmas ancas, as mesmas idades. De preferência, tudo ao mínimo, excepto a altura e a boca... A magreza tornou-se um dogma, assim como ser gordo foi noutros tempos, mas agora em dimensões muito mais extremas e globais.
As mulheres são, incrivelmente, os seus maiores polícias. E não se perdoam, vêem-se do dobro do tamanho que realmente são, obrigando-se a atravessar todo o género de processos, dos comprimidos aos batidos, da fome ao Talon. Admiro-lhes a força de vontade, mas confunde-me aquela estranha esperança de que a felicidade está no fim daquela dieta. Pior do que isso, espanta-me que nos tenhamos tornado tão intolerantes justamente naquilo com que já nascemos. Ou seja, naquilo que mais difícil, se não impossível, é de mudar. Pelo menos de forma definitiva.
As lojas fazem-lhes a vontade. Lugares como a Zara, a Mango, a Bershka e outros, são um perfeito gozo à constituição natural do ser-humano. E quem acha que aquilo é mesmo um XL, vá dar uma voltinha à Europa, porque anda um bocado desligado da realidade...
Na televisão, também lhes fazem a vontade. Os programas mostram a felicidade que vem agarrada ao perfeito sacrifício da carne, e atravessam-se verdadeiras torturas simplesmente para entrar dentro do padrão. Aquelas pessoas choram lágrimas sinceras por vidas permanentemente atormentadas pelo escárnio dos outros, e portanto são elas que mudam para agradar e ser aceites por quem sempre as maltratou. Em vez de serem os outros, os intolerantes, a mudar.
Pior ainda parece ser envelhecer. De facto, devia ser proibido. Porque rugas, só mesmo nos recém-nascidos. E à medida que vão tendo mais anos, olham para as mais novas como se fossem elas as donas da juventude eterna, e não fossem mudar nunca, como lhes aconteceu a elas.
Uma coisa é ter saúde. Outra é simplesmente não aceitar a diferença. Não amar a diferença. Cada vez mais tornamos a vida mais difícil para nós próprios e, pior ainda, para os nossos filhos. Parece que só estaremos satisfeitas quando formos todas meio plásticas e paus de virar tripas.
Pela saúde, faz-se exercício e come-se bem, de forma equilibrada. Agora se estas mulheres pensam que vão ter ou manter um homem, que vão ser felizes e bem sucedidas, só porque se assemelham a uma tábua de passar a ferro... pensem outra vez.
Por alguma razão se diz “se queres amor para sempre, casa-te com alguém com quem gostes de conversar.” A diferença é o melhor do ser-humano. E recomenda-se.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Par ou Ímpar

Para a maioria dos comuns mortais, é impressionantemente difícil encontrar um par. A sensação de depender de um acaso, da sorte, de uma eventualidade, é enorme. Uma espécie de dança das cadeiras, em que nos apavoramos com a ideia de a música parar e acabarmos sem lugar onde sentar. É muitas vezes nessa altura que mais damos valor ao par. Aquele com quem vamos dormir, fazer amor, ir ao supermercado, jantar, passear, conhecer lugares novos. Aquele que vamos tratar tão bem, que vamos sempre estimar tanto, e com quem até as tarefas mais rotineiras vão parecer sempre especiais. Ainda não o conhecemos e já sabemos o quanto nos vamos dedicar sempre a ele.
Os que não têm par olham normalmente com alguma inveja (natural) e algum sentido de injustiça, para os pares. Os que tiveram sorte - muita sorte - e encontraram-se.
Mas começo a perceber que, para muitos pares, o que se passa lá dentro não é bem aquilo que imaginámos. Fico surpresa por perceber que, pelos vistos, a maioria dos pares não dá afinal um ao outro metade daquilo que podia dar. Não sei bem o que é. Se a rotina, os filhos, a falta de tempo, a habituação, o constrangimento, o garantido, a preguiça, o egoísmo, que serve de desculpa. Mas parece que há por aí muita gente que não se dedica a proporcionar prazer ao seu par. E não, não estou a falar de sexo. Pelo menos não só.
Pôr aquela música ao fim da noite, e anichar-se na cama a conversar, fazer uma massagem relaxante ao par que chegou cansado a casa, preparar-lhe a banheira com água quentinha e perfumada para o par descontrair lá dentro, apagar as luzes, acender umas velas e beijar sem ser a correr, beijar-lhe os olhos, fazer um cafuné... Há tanta, tanta coisa que podemos proporcionar ao nosso par. Temos tanta coisa ao nosso alcance, que não custa dinheiro, e que dá a quem amamos a melhor sensação do mundo: a sensação de ser amado.
Jovens ou menos jovens, mais ou menos “modernos”, com mais ou menos estilo, mais ou menos tímidos, fico chocada com a quantidade de pares que afinal existem sem tirarem partido daquilo que só fazer parte de um par pode proporcionar. Aquilo que os outros, os sem-par, tanto desejavam para si.
Preocupamo-nos tanto em alcançar as coisas que custam mais dinheiro, que nos tiram mais tempo, que nos deixam mais exaustos e impacientes. Quando o melhor do mundo já lá está em casa. E a quem podemos tão facilmente proporcionar... o melhor do mundo.
A verdade é que não entendo como é que, podendo sentir toda esta felicidade, todo este prazer, quer a dar, quer a receber, a maioria das pessoas prefere simplesmente ficar à margem de ser par, e viver no essencial com se fosse ímpar.